Nascido e criado na Vila Jardim, na zona Leste de Porto Alegre, Jorge Aguiar começou a trilhar seu caminho na fotografia aos 14 anos. Hoje, com 50 anos de carreira, ele é uma referência não só pelo talento e trajetória, como também pelo impacto social de seus projetos educativos em comunidades periféricas.
Seu primeiro contato com a fotografia veio por meio de seu primo, Paulo Dias, também fotógrafo. “Ele me chamou e disse: ‘Amanhã tu vai ao endereço tal, porque eu vou te ensinar uma profissão.’ Eu perguntei quanto ia ganhar. ‘Nada, só as passagens,’ ele respondeu”, conta Aguiar.
Assim começou a jornada de dois anos, onde Jorge mergulhou nas entranhas da química fotográfica analógica, dominando cada processo com dedicação e maestria. Sua habilidade e paixão pela fotografia o levaram a trabalhar como repórter fotográfico em grandes jornais de Porto Alegre, como o Diário de Notícias e o Jornal do Comércio.
Fotojornalista da editoria de polícia
Suas lentes testemunharam os eventos políticos e sociais que moldaram a história de Porto Alegre nas décadas de 1970 e 1980, capturando momentos fugazes que marcaram as páginas dos jornais gaúchos.
No entanto, foi nos bastidores da reportagem policial que Jorge encontrou sua verdadeira vocação. “Fotografar polícia é interessante, porque quando saiamos para fazer uma reportagem policial era uma aventura, sobe morro, desce morro”, compartilha Aguiar.
Além disso, foi fotógrafo do Departamento de Criminalística de Porto Alegre. “Eu gostava dessa temática, apesar dos casos. Eu via as necessidades das periferias e isso acabou tocando em algo em mim”, lembra Aguiar.
E nasce o Click da Kombi
Foi durante essas incursões pelas comunidades de Porto Alegre que Jorge começou a perceber o potencial transformador da fotografia. Enquanto registrava os dramas e as alegrias das comunidades marginalizadas, ele se viu inspirado a usar sua arte como uma ferramenta para promover a mudança social.
Em 1976, na cidade de Alvorada, Jorge iniciou um projeto de fotografia em lata (também chamado de pinhole) com crianças de uma escola municipal. Mais tarde, a iniciativa foi batizada de Click da Kombi.
Em 2003, o Click da Kombi recebeu o Prêmio Direitos Humanos da Unesco como melhor projeto de divulgação dos direitos humanos no Rio Grande do Sul. Jorge tem levado sua paixão por ensinar e transformar vidas para comunidades em várias partes do mundo, incluindo Espanha, França, Portugal, Japão e Iraque. “Fotografia é memória e memória é história. “Eu consigo equipamento, qualifico-os como fotógrafos de sua comunidade”, explica Jorge.
Participação no Descentralizado
Agora, Jorge traz esse projeto transformador para o FestFoto – Descentralizado, promovendo uma oficina de pinhole com crianças e adolescentes do Coletivo Autônomo do Morro da Cruz e com mulheres que trabalham na Unidade de Triagem de Resíduos Recicláveis Vila Pinto.
“Eu levo uma lata para mostrar e cada um leva a sua para preparar. Eles lavam, adaptam, fazem um furinho com prego e colocam uma folha de alumínio de latinha de refrigerante com um furinho de agulha, fixada com fita isolante preta, que será a janelinha da câmera pinhole”, explica Aguiar.
Depois, os alunos saem às ruas para fotografar. Eles posicionam as latas, abrem o buraquinho por dez segundos, fecham e seguram. Já na Kombi, eles revelam as fotos. “O objetivo é ensinar a pensar antes de fotografar, mesmo com o celular, trabalhando enquadramento, simetria e estética”, ressalta Aguiar.
O impacto dessas oficinas vai além das imagens capturadas; elas despertam curiosidade e interesse pela arte da fotografia e fazem com que os participantes se vejam como parte importante de suas comunidades.
Jorge acredita que a arte, seja fotografia, hip hop, funk ou grafite, é uma forma poderosa de impulsionar os sonhos e os desejos das pessoas, mesmo em meio às dificuldades e às pressões sociais. E é com essa convicção que ele continua a inspirar e capacitar as próximas gerações de fotógrafos nas periferias de Porto Alegre e além.